O ataque das reformas previdenciárias à pensão por morte

A pensão por morte, mais do que um benefício previdenciário, é um direito de natureza social concedido aos dependentes do servidor público falecido a fim de garantir sua subsistência. Para isso, o servidor precisou contribuir para o RPPS durante toda a sua vida funcional, portanto, não se pode falar que se trata de um privilégio pago à sua família.

Todavia, as reformas advindas a partir de 2019 não viram a pensão por morte como de fato ela é: um direito fundamental. E ao se proporem “eliminar privilégios”, a pensão por morte foi um dos benefícios mais afetados negativamente pelos textos reformistas.

A mudança mais negativa é a do valor da pensão por morte poder ser inferior a um salário mínimo quando essa não se tratar da única fonte de renda formal auferida pelo dependente (art. 40, § 7º, CF), já que historicamente sempre foi assegurado o valor de um salário mínimo aos benefícios de pensão por morte.

E por força das novas regras de acumulações de benefícios (art. 24 da EC nº 103/2019), passou a ser comum vermos dependentes de servidores falecidos receberem proventos de pensão por morte inferiores a um salário mínimo.

Para os servidores federais, as novas regras de pensão por morte estão previstas no art. 23 da EC nº 103/2019 e passaram a vigorar imediatamente após sua publicação. Para os servidores do Estado de Santa Catarina, porém, as novas regras só passaram a vigorar a partir de 01.01.2022, nos termos do art. 73 da LCE nº 412/2008.

Em essência, as regras de ambos são as mesmas. O valor base da pensão por morte é calculado sobre os proventos de aposentadoria do servidor falecido ou sobre os proventos a que teria direito se fosse aposentado por incapacidade permanente no caso de servidor ativo – nessa segunda hipótese, o valor base já sofre uma redução significativa.

Sobre o valor base calculam-se as cotas familiares, que é de 50% para servidores federais e de 60% para servidores estaduais de Santa Catarina, mais 10% por dependente até o limite de 100%. Esse será o valor da pensão, que será dividido entre os dependentes. Então, por exemplo, se o servidor instituidor tinha dois dependentes, o valor da pensão é 70% ou 80% do valor base, o que é rateado entre ambos. Porém quando um dos dependentes perde essa condição, sua cota-parte não é reversível para os demais, ou seja, é feito um novo cálculo a partir do valor base, agora sem a cota-parte perdida, para se chegar ao novo valor da pensão por morte.

A título de comparação, antes da vigência da EC nº 103/2019, o valor da pensão era igual ao valor dos proventos de aposentadoria do servidor falecido ou da totalidade da remuneração no caso de servidor ativo – o que já dá uma enorme diferença em comparação com a regra atual –, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do INSS (R$ 7.087,22 em 2022), acrescido de 70% da parcela excedente a esse limite. Esse valor era dividido entre os dependentes e quando um dos dependentes perdia essa condição, sua cota-parte era revertida para os demais.

Mas voltando as regras vigentes, na hipótese de existir dependente inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave, o valor da pensão por morte será igual a 100% do valor base até o limite máximo estabelecido para os benefícios do INSS, acrescido de 50% mais 10% por dependente da parcela excedente a esse limite. E quando não houver mais dependente inválido ou com deficiência intelectual, mental ou grave, o valor da pensão será recalculado pela regra geral. Essas regras valem tanto para o servidor federal quanto para o servidor estadual de Santa Catarina.

A LCE nº 412/2019 porém avança um pouco mais nas regras de pensão por morte. O seu art. 73, § 4º prevê que o cônjuge ou companheiro de servidor ativo do RPPS/SC, com no mínimo 18 meses de contribuição e que faleceu por acidente no exercício da função ou por agressão sofrida em razão de sua atividade, receba pensão vitalícia equivalente à totalidade da remuneração no cargo efetivo em que se der o falecimento. Trata-se de uma exceção à regra geral que, curiosamente, se aplica apenas ao cônjuge ou companheiro do servidor falecido. O texto legal dá margem a interpretarmos, por exemplo, que o filho de um servidor ativo solteiro, que veio a óbito por agressão sofrida em razão de sua atividade, seria relegado à regra geral, o que não se mostra razoável.

Também há a previsão legal do valor da pensão por morte ser calculada com base nos proventos de aposentadoria voluntária cujo direito o servidor ativo tenha adquirido antes do óbito, desde que resulte em situação mais favorável (art. 76, § 5º, LCE nº 412/2008). Essa hipótese facilmente se verifica quando o servidor falecido recebia o abono de permanência, devendo o cálculo ser realizado para poder apurar se é ou não mais favorável para os dependentes (normalmente é).

É importante destacar que a reforma catarinense foi um pouco menos severa com a pensão por morte do que a reforma nacional, o que se vê em pequenos acenos, como prever cota familiar mínima de 60% ou garantir pensão vitalícia ao cônjuge ou companheiro igual à totalidade da remuneração do servidor ativo que veio a falecer por acidente no exercício da função ou por agressão sofrida em razão de sua atividade, o que beneficia em especial as carreiras de policiais penais, agentes de segurança socioeducativos e policiais civis. A desconstitucionalização das regras previdenciárias permite que os Estados, Distrito Federal e Municípios estabeleçam suas próprias regras de pensão por morte.

Porém no cenário global, a pensão por morte foi sim severamente golpeada. Medidas como constitucionalizar a possibilidade da pensão por morte ser paga em valor menor que um salário mínimo, alterar a base de cálculo da pensão deixada por servidor ativo, e somada a todas essas, as novas regras constitucionais de acumulação de benefícios com pensão por morte, resultaram em um verdadeiro vilipêndio. Como dito anteriormente, pensão por morte não é um privilégio e sim um direito decorrente das contribuições pagas pelo servidor instituidor ao respectivo Regime de Previdência com o único propósito de garantir o sustento de seus dependentes após a sua morte. Mas nem isso as reformas previdenciárias souberam respeitar.

Fonte: Rafael Campos Advocacia.

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