O Tema 942 e o direito à conversão do tempo especial em tempo comum para servidores públicos

A Constituição Federal, a partir da sua Emenda nº 20/1998, passou a permitir a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos servidores públicos que exercem atividades exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem sua saúde ou sua integridade física, na forma da lei.

Ocorre que essa lei complementar nunca foi proposta, o que fez as entidades sindicais representativas na época acionarem o Poder Judiciário para sanar essa mora legislativa que inviabilizava o acesso desse direito aos servidores públicos.

Através de Mandados de Injunção – remédio constitucional concedido sempre que a falta de norma regulamentadora tornar inviável o exercício dos direitos constitucionais (art. 5º, LXXI, CF) –, os servidores públicos puderam adotar as regras de aposentadoria especial do Regime Geral de Previdência Social (art. 57 da Lei nº 8.213/91), e com isso, muitos tiveram averbado ao seu tempo total de contribuição o tempo especial convertido em tempo comum pelos fatores legais, garantindo assim benefícios previdenciários mais vantajosos.

Mais adiante, porém, o Supremo Tribunal Federal, ao revisitar a matéria, decidiu naquele momento limitar o alcance do art. 57 da Lei nº 8.213/91 para os servidores públicos, de maneira a não mais autorizar a conversão do tempo especial em tempo comum para efeito de concessão de qualquer benefício previdenciário. No entendimento da Suprema Corte, o direito à conversão para os servidores somente poderia ser alcançado por meio de ato normativo próprio. A partir desse novo julgamento, foi promulgada em 09.04.2014 a Súmula Vinculante nº 33:

“Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica”.

Ocorre que o tema da conversão do tempo especial continuou repercutindo na Suprema Corte, mesmo após a reforma da previdência de 2019 (Emenda Constitucional nº 103). E em 31 de agosto de 2020, ao julgar o RE nº 1.014.286, o STF fixou a tese do Tema 942:

“Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC n.º 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República”.

Ao fixar a tese, entendeu a Suprema Corte que, “ao permitir a norma constitucional a aposentadoria especial com tempo reduzido de contribuição, verifica-se que reconhece os danos impostos a quem laborou em parte ou na integralidade de sua vida contributiva sob condições nocivas, de modo que nesse contexto o fator de conversão do tempo especial em comum opera como preceito de isonomia, equilibrando a compensação pelos riscos impostos”.

Na prática, os servidores públicos voltam a ter garantida a conversão do tempo trabalhado sob condições especiais em tempo comum para fins de concessão de qualquer benefício previdenciário, porém agora limitado até o dia 13.11.2019, data da publicação da EC nº 103. Inclusive, alguns órgãos da Administração Pública já estão concedendo administrativamente a averbação do tempo convertido ao tempo total de contribuição de seus servidores, mediante requerimento. Já nos casos em que a conversão não esteja sendo deferida, os servidores devem ingressar em juízo para garantir o seu direito. A conversão do tempo especial em tempo comum pode garantir acesso a uma aposentadoria mais vantajosa, além de outros benefícios previdenciários, como por exemplo, o marco inicial do abono de permanência.

Fonte: Rafael Campos Advocacia.

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